Refém do coração
Refém do coração
Por: Cristina Figueiredo
1.Sorte incomum

Tem pessoas que nascem com sorte e outras não, e sem dúvida eu pertenço ao segundo grupo. 

No véspera do meu aniversário de 30 anos resolvi fazer uma viagem para a Espanha, não que eu pudesse ou tivesse dinheiro para isso, mas a verdade era que eu me sentia totalmente estagnada e sentia que minha vida estava para e sem rumo, eu precisava fazer alguma coisa para consertar a minha vida ou pelo menos tentar fazer alguma coisa para que eu pudesse viver “uma vida mais emocionante”.

Eu não ia sozinha, mas sim com a minha amiga Fabiana, a gente se conhecia desde o ensino médio e não me lembro de um momento em que ela não estivesse presente e como ela disse que ia viajar resolvi ir com ela.

Antes eu teria que pedir uma licença no meu trabalho, eu trabalhava em uma empresa de publicidade, lá eu ficava responsável pela parte financeira, eu era assistente. Consegui esse emprego depois que eu entrei na faculdade de contabilidade e acabei não me adaptando e saindo. Eu não tinha nenhum tipo de formação específica, já que eu gostava muito de arte, mas meus pais não “incentivavam” muito, eles viviam dizendo que nessa vida a única coisa que dava dinheiro eram profissões mais “tradicionais” e como eu ainda morava com eles eu tinha dançar conforme a música.

Acordei e me arrumei, pensando no discurso que eu faria quando fosse até o Sr. Martinez pedir a minha “folga” de duas semanas. Me arrumei rapidamente e corri para tomar café, quando sentei a mesa meu irmão estava sentado e me olhou sorrindo:

-Você viu que está com a blusa errada? - ele disse sorrindo

-Olhei para a blusa e ela estava ao contrário, como eu não percebi isso, dei de ombros e resolvi trocar antes de sair.

Meu pai estava sentado na mesa me olhando enquanto minha mãe colocava café para ele, me levantei e peguei uma xícara de café e me sentei de novo e dei uma mordida grande no pão e comecei a praticamente socar a comida na minha boca.

-A comida não vai fugir do prato, sabia? - Meu pai falou sorrindo, eu apenas olhei para ele e sorri

-É que eu estou atrasada - Falei com a boca cheia 

-Não fala de boca cheia Lena, é falta de educação! - Minha mãe falou horrorizada

-Desculpe é que eu estou atrasada!

-Mesmo assim, você devia acordar mais cedo então!  - Ela falou enquanto se sentava - Quando é que você vai criar juízo?

-Mãe, eu vou ajeitar minha vida!

-Helena, você vai completar 30 anos na semana que vem, a maioria das moças com a sua idade já tem uma carreira e uma família!

-Mas eu já tenho uma carreira e uma família!

-Filha, trabalhar como assistente na agência não conta - respondeu meu pai me olhando por aqueles óculos grossos -  Sempre te incentivei a fazer uma faculdade na área da saúde ou ser advogada como sua mãe, são tantas possibilidades que você ainda pode fazer faculdade.

-Seu irmão parece ter mais juízo que você! - minha mãe falava enquanto acariciava os cabelos do meu irmão.

Eu comecei a sentir minha garganta seca e tomei um longo gole de café, eu sentia ele queimar a minha boca, mas eu não estava mais disposta a escutar aquela conversa, eu estava  de saco cheio das pessoas ficarem dando opinião na minha vida, como se tudo não fosse complicado.

-Eu me levantei e comecei a caminhar até a porta

-Onde você vai? - Minha mãe perguntou

-Trabalhar!

Peguei minha bolsa e sai, eu me sentia uma fracassada! Eu só não podia admitir isso na frente deles, eu estava cansada dessas comparações o tempo todo. Minha mãe era uma das melhores advogadas da região e meu pai era um cirurgião famoso, sim eu era o fracasso da minha família! Todos tinham profissões promissoras na minha família, desde os meus avós até meus primos, tinhamos juízes e até mesmo professores universitários! Não era a toa esse meu sentimento e por mais que eu tentasse eu não conseguia seguir com essas profissões e com o passar dos anos o peso era maior e a pressão mais constante. Entrei no ônibus e coloquei meus fones de ouvido, entrei no meu mundinho, as pessoas me olhavam, mas eu não ligava pois era meu momento mais relaxante do dia.

Olhei no meu relógio e vi que eu estava atrasada, mas não tinha nada que eu pudesse fazer já que eu estava no ônibus e eu tinha que pegar duas conduções até meu trabalho.

Ao chegar na porta entrei correndo e ouvi pequenas risadas, olhei para trás e não vi ninguém, foi quando a Karina apontou para mim e fez um gesto puxando a própria blusa.

-Puta que pariu! - Falei e coloquei a mão na cabeça

Eu olhei para baixo e lá estava ela, minha blusa vestida ao contrário. Coloquei a bolsa da frente e corri até o banheiro mais próximo, conseguia escutar as risadinhas e os comentários. Eu entrei em uma cabine e tirei rapidamente a blusa, foi quando eu escutei a porta abrindo e a voz de duas mulheres.

-Você viu quem chegou? A nojenta 

-Eu não entendo como uma empresa grande deste jeito ainda contrata pessoas assim! Ela não tem qualificação nenhuma, chega atrasada e ainda por cima é toda desajeitada, parece que não liga para a própria aparência! Parece que foi adotada, eu conheço a prima dela a Carolina, ela é modelo sabe? Super sucedida e o oposto dela! Ela parece uma princesa, se eu não trabalhasse no RH eu não acreditaria que as duas eram da mesma família.

Eu sai e elas me olhavam assustadas, eu fui até o espelho e ajeitei o meu cabelo olhei para as duas e disse:

-Bom dia, meninas!

-Bom dia, He..lena.. Tu.. do bem? - Gabriela me olhava sem graça

-Estou ótima! Bom preciso ir, bom trabalho!

Peguei minhas coisas e saí, eu sabia o que todos pensavam sobre mim e era verdade eu só consegui esse trabalho por conta da amizade do meu pai com o dono, eles eram amigos de infância e por isso eu me sentia ainda pior e tentava compensar minha falta de “habilidade” com muito esforço e horas extras.

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