Quarta sessão

Eu conheci um homem. Ele derrubou minha segurança. Desafiou minha estrutura. Céus! Fico perplexa quando penso no que estou sentindo!

Sim, quero falar sobre isso.

Eu estava procurando lojas de antiguidades no centro da cidade.

           Sim, tem a ver com as fotos que te mostrei.  Tudo tem a ver.  Não tão diretamente, é claro.  Lembre-se, eu ando de viés.

           Numa dessas noites, eu estava lá em casa sozinha.  Pensava a respeito de uma matéria para a minha coluna sobre o Rio.  Imaginei uma crônica sobre o que restava do Rio antigo.  Não apenas as fotos, mas alguma coisa mais pessoal, mais romântica, que caracterizasse as antigas mansões, relembrasse os saraus, as domingueiras... Alguma coisa tipo Machado de Assis... Cheguei a escrever... “Rio Residual”.  Ficou bonito, até.  Mas como eu estava dizendo, eu queria encontrar objetos que caracterizassem uma época, quem sabe?  Falassem da história de famílias... Perambulei, mas tudo parecia muito óbvio, nada personificado.  Foi quando eu parei pra tomar um refrigerante num daqueles barzinhos azulejados da Praça da República. Eu estava ali, pensando se haveria outras opções, quando reparei num anúncio de cerveja que levantava e abaixava com o vento do ventilador de pé, ao meu lado. Olhei por acaso e vi, sob ele, um anúncio que me chamou a atenção: era sobre uma loja de antiguidades.  O “Bas-Fond”.  O endereço era por aquelas redondezas.  Alguma coisa me dizia que eu ia achar lá o que procurava.  E eu corri atrás.

           Sempre há uma atração por aquilo que está debaixo das saias? 

(Ri).

 É verdade.

Mas, antes, deixa eu voltar um pouco a fita.

           Naquela mesma noite em que eu pensava sobre a matéria, percebi o silêncio dentro de minha casa.  Era um silêncio assustador.  Não havia um barulho na rua.  O ar parecia parado.  Olhei à minha volta e examinei a minha sala.  Impecavelmente limpa e arrumada.  Uma perfeita assepsia convivendo com uma imensa solidão.  Nem era tão tarde assim. Onze horas. Levantei e coloquei um CD: “Mme. Butterfly”.  A música foi entranhando  minha carne e minha alma, confirmando meu isolamento. Os móveis, escolhidos pelo Márcio, me pareceram tão desapropriados! O vidro e o metal, os tons de azul e verde...

Não, eu não escolhi nada.  Na verdade, esse era o apartamento de solteiro do Márcio.  Eu só compareci.  Acho que essas coisas de casa nunca foram muito bem trabalhadas na minha cabeça. Um dia a gente fala sobre isso.

           Comecei a encucar que eu deveria dar meu toque pessoal naquele lugar.

Sim, como um toque de massagem.

Bem, achei que se eu aproveitasse o que eu já ia fazer no dia seguinte, isso de procurar lojas de antiguidades, poderia achar alguma coisa que incrementasse aquele ambiente... Mas o que eu encontrei foi muito mais do que isso...

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